14.6.06

telegrafando o passe (ou um relato desinteressante)

Eu até já tentei começar a torcer pra um time pra ter alguma coisa pra conversar com garçons e porteiros e me sentir assim mais integrada com o popular, não deu certo. De uma maneira geral (mas não total), tenho uma certa dificuldade com exclusividades e durabilidades. Nem com o Brasil como time (ou como qualquer coisa...) eu cheguei a me animar muito, em nenhuma Copa ou Olímpiada, nem quando todas as adolescentes, minhas amiguinhas, suspiravam pela seleção de vôlei. Enfim, tudo isso pra dizer que o amor surge nos lugares mais inesperados.

Foi por causa de um vôo atrasado que tudo começou. Entrei, entediada, na livrariazinha do Galeão, procurando alguma coisa bem pouco intelectualmente estimulante pra ler, quando eu o encontrei: o Álbum da Copa. Desde então eu tenho um motivo para acordar todas as manhãs: completar até o espaço do último pobre jogador de Angola (dos dois últimos, né?, que Angola não tem direito, segundo o fabricante de álbuns, de ter uma figurinha por jogador). Eu podia ter comprado também o álbum da Moranguinho e ficar nostálgica. Mas, como eu tenho 27 anos, prefiro ver fotos de mais de 500 homens do que de bonequinhas com nome de comida.

Até aí, de todo jeito, era só o papel e eu e os cromos auto-adesivos. Eu ia ver só o jogo de Portugal, porque é a camisa mais bonita, e o do Brasil, porque todo mundo pára de fazer tudo mesmo... E eis que sexta-feira eu caio doente. Numa casa inteligentemente sem TV a cabo. E eis que eu sou uma falsa intelectual e quando fico doente não tenho nenhuma vontade de ler nada que preste. (E eis que não tinha mais figurinha pra colar...). Vi todos os jogos. Sei todos os placares. Cada ponto forte e cada ponto fraco de cada seleção. Cada comentário imbecil de cada narrador da Globo. Obsessão, enfim.

A Copa (e o álbum) já me possibilitaram boas supresas e sutis alegrias. Descobrir como os japoneses são fotogênicos e os portugueses, não. Conversar com o homem mais interessante da festa sobre como é essa compulsão dos sem-time pelo álbum da Copa e sobre como é ver um jogo com 44 jogadores e duas bolas em campo, e o relógio mostrando 2521:521 do 11o tempo. Chorar com a alegria de um povo que eu nem sei como se chama (quem nasce em Trinidad e Tobago é...?). (Chorar mesmo.) Comentar "você viu como o Totti ficou bem melhor de cabelo curto?". E até saber a seleção completa do Brasil (que dizer, teve um que não veio, né?).

Agora vou colar mais figurinhas (é verdade, não é só pra poder terminar essa porcaria). Aliás, sob o risco de me humilhar publicamente, conto que hoje, na volta, confundi o horário do vôo e cheguei ao aeroporto uma hora mais cedo. Claro que fui direto à livraria comprar figurinhas. "Não temos figurinhas" (São Paulo...). Avistei na porta, do outro lado da avenidona, uma banca. E lá fui. E me diz a velhinha: "Não tenho figurinhas" (velhinhas...).

Sob o peso de três bolsas, quatro horas de sono mal dormido e uma amidalite semi-curada, pergunto: "A senhora sabe onde tem outra banca aqui perto?". Com a gentileza dos não amantes da Copa, ela me diz: "ali perto da padaria" e me aponta qualquer lugar entre Interlagos e Berlim. E eu sigo até achar um taxista, que olha pro salto da minha bota e diz "ih, olha, é umas seis quadra daqui." Lágrima brilhando, resmungo "ah, que pena, muito longe". Comprei 20 pacotinhos, 100 figurinhas, só 8 repetidas. Bolha por bolha, agora até o Figo tem.


2 Comments:

Anonymous Anónimo said...

eu comprei o álbum também. me arrependi 10 minutos depois, mas depois desarrependi de novo. eu fazia o álbum dos boleiros quando criança (campeonatos paulista e brasileiro, e também o da copa), junto com os da moranguinho e afins. é bom. é bom. mas às vezes acho que sei muito de futebol, e que os rapazes preferem as que não entendem nada. e me parece que eu não sei mais nada de moranguinhos. tá. juntou copa com dia dos namorados e eu fiquei assim.

4:07 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Engraçado, uma Copa, e tudo fica assim, assim, meio que bonito letrado: as letras mais flexíveis, - você, até, parece, mais até.
Eu, de contra-peito, é que não jogo, e joguei; é que não coleciono, - nem ''bafo'', -terrível nome, péssimo hábito - , apalpei ; da moranguinho não falo, nem digo dizendo: é óbvio, o dito;
Mas, no fim deste texto, - melhor seu, um dos mais, ao lado do picolé falante e outros, há-de; - é que me veio a vontade de colecionar mas é vida, a Vida...Essas figuras, não das dos jogadores, elas estão tão aí...Coladas, pregadas e dançantes: e, no mais todo bom.

2:19 da manhã  

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