29.6.07

Você ainda faz
cara de surpresa e
tenta dizer que
nunca, nem um pio,
sobre esses
cílios longos
sobrancelhas fortes
essa descompostura.

E eu ainda rio
e tento dizer que
as coisas, às vezes,
dão certo.


17.6.07

música é um lugar solitário.


11.6.07

a adolescente

Não deixo de me sentir livre sob os pilotis;
não deixo de me ver de fora
como em uma grua, num plano aéreo;
a mocinha percorre rápida toda a distância,
mas o vão é enorme, nunca termina;
o mocinho a alcança ainda a tempo
de um belo enquadramento.

Mão no ombro, não se vá;
Camisa branca de botões,
cachos ruivos ao vento frio.
Mão no ombro, um sorriso sincero;
não se vá, não se vá.


8.6.07

4 a.m.

Para adormecer
inventando histórias
encadeando acontecimentos -
ficção;
o coração dá o bote:
na minha novela
você me beija antes
de me encontrar -
meus olhos arregalados
na escuridão.


3.6.07

platonismos

No dia em que meu coração morreu, ele sorria seu sorriso de mil dentes. Eu nunca tinha visto um sorriso assim, de criança, tão cruel quanto sincero. O dia em que o coração da gente morre é sempre cafona, feito de peito gelado, mãos mornas, falta de esperança e muitas obviedades. Mas no dia em que meu coração morreu, não chovia. Choveu, muito, no dia seguinte. Eu pisei no freio com tudo, mas a pista estava molhada. E ele continuava sorrindo seu sorriso de mil dentes em alguma outra parte da cidade, no espelho, pra alguém e alguma outra piada boba. Meu coração já estava morto e outra mulher, quem sabe, olhava sem atenção para aquele sorriso de mil dentes. Depois que meu coração morreu, continuei a amar, mas escrever passou a sujar as lembranças, já tão aturdidas mas ainda de cores perfeitas, o pacote de cigarros na mesa, uma seqüência de canções, todo um passado dilacerado por aquele sorriso de mil dentes.